sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Tudo o que sei é que nada sei



Quando eu tinha 23 anos e celebrava a conclusão da minha primeira pós graduação em Análise de Sistemas no Mackenzie, ao mesmo tempo em que a empresa onde eu trabalhava me acenava com a perspectiva da terceira promoção de uma carreira com potencial bastante promissor na área de Tecnologia de Sistemas de Informação, eu acreditava cegamente que sabia de tudo sobre a vida. Bem, tudo não, mas pelo menos 80% de tudo o que eu deveria saber.

Hoje, perto de completar 50 anos de vida e sendo bastante otimista, me sinto até petulante em afirmar que devo ter adquirido uns 2% de tudo o que deveria saber na minha vida. Você pode não só achar estranho esta afirmação, mas até mesmo criar uma imagem negativa de mim, como alguém que parou no tempo e não fez mais nada na vida. Pelo contrário. Nestes 27 anos, desenhei, escrevi e implementei vários sistemas de informática,  escrevi e publiquei três livros, organizei competições de planos de negócios, competições internacionais de inovação corporativa e montei dois MBAs e dois Centros de Empreendedorismo. Ganhei prêmios de educação, de inovação, de planos de negócios, de fotografia e de sistemas de automação. Também treinei mais de 1.000 pessoas e influenciei as decisões de carreira de pelo menos 15 ex-alunos que se tornaram empreendedores por minha causa. Já tive carreiras bem sucedidas em duas multinacionais americanas, mudei da área de Informática para a área de Administração e tive dois negócios próprios.

Neste período eu fiz mais duas pós graduações, um mestrado e um doutorado. Me casei e tive 3 filhos, construí uma casa, morei no interior, aprendi mais duas línguas, morei nos Estados Unidos, conheci mais de 20 países, salvei a vida de um motociclista acidentado e me tornei faixa preta de caratê. Já escapei de três assaltos e enfrentei um assaltante frente a frente. Conheci todo o litoral brasileiro do Ceará ao Rio Grande do Sul. Construí sólidas amizades com missionários, gays, pescadores, lavradores e artistas. Já fui voluntário em brigadas de segurança, tive que vender bens pessoais para viver e já apanhei para proteger amigos. Fui seguidor do budismo tibetano e fiz muito camping selvagem. Já experimentei drogas e fugi de restaurante sem pagar a conta. Já vivi a experiência de quebrar um braço e já passei por duas cirurgias. Já me perdi na floresta, tive carro quebrado no meio do nada e li mais de 200 livros.

Enfim, já passei por muita coisa nesta vida. Então porque considero que sei tão pouco sobre a vida?
Acho que quanto mais eu conheço sobre o mundo, mais eu me dou conta do quanto este mundo é complexo, grande e rico. Por mais intensa que tenha sido minha vida, na verdade, devo humildemente admitir que eu nem sequer cheguei perto de arranhar a árvore do conhecimento humano e que há muita coisa ainda para viver e aprender.

Quando somos jovens e inexperientes acreditamos que o nosso conhecimento do mundo à nossa volta corresponde a toda a realidade que precisamos controlar e dominar. Nosso escopo é limitado, mas não sabemos disso e é por isso que, arrogantemente, julgamos estarmos preparados para tudo, para a vida. Na medida em que vamos caminhando pela estrada da vida é que percebemos o quanto ela é longa e cheia de ramificações e estas descobertas vão nos dando uma percepção mais clara do quanto a realidade é mais ampla do que imaginávamos antes. A humilde constatação de nossa pequenez é uma manifestação da sabedoria que fez o filósofo grego Sócrates proferir a frase que encabeça este texto. E adquirir sabedoria é que precisamos ter como alvo em nossas vidas. E o que é a sabedoria? Na minha visão é um conceito que só pode ser entendido quando entendemos sua estrutura completa, a qual explico nas rápidas palavras a seguir:

O primeiro nível é o do dado. Na década de 80, os computadores serviam basicamente para processar dados, a unidade mais básica da informação. Um número com 98302103 é um dado, assim como Al. Dos Gerânios, nr. 458. Um dado sozinho não significa absolutamente nada se não estiver contextualizado. Esta contextualização vem através do segundo nível que é a informação.

A informação é um dado com algum significado. Assim, 98302103 é o número de um telefone celular e Al dos Gerânios, nr. 458 é um endereço. Na década de 90, os computadores evoluíram para não apenas processar dados, mas gerar informações a partir deles. Com base na Tecnologia da Informação foi possível tomar decisões melhores e chegar a resultados com muito mais rapidez. Com o tempo, apenas manter e produzir a informação deixou de ser suficiente. Foi o advento da Gestão do Conhecimento, (o terceiro nível) na década de 2000 que a humanidade subiu mais um nível.

Conhecimento então, nada mais é que uma informação contextualizada em uma determinada situação. Desta forma, o número do celular é de uma aluna minha muito bonita e o endereço é de onde ela mora. O conhecimento é um nível sofisticado de informação porque apela para a conexão de informações diferentes para serem usadas para determinados propósitos. A capacidade cognitiva de cada pessoa ajuda a tirar maior ou menor proveito deste conhecimento, pois a mesma informação pode ter significados diferentes para cada pessoa. É neste momento que a variedade de vivências que passamos pela vida faz toda a diferença, porque quanto mais experiências, mais interpretações diferentes podemos ter sobre a informação e, consequentemente, gerar muito mais conhecimento relevante.

O último nível é justamente o da sabedoria e envolve o uso que damos ao conhecimento que detemos. É a sabedoria que me diz para não convidar a minha aluna para sair. Não existe ainda tecnologia para trabalhar a sabedoria. Esta é ainda uma qualidade essencialmente humana. Pessoas sábias sabem usar da melhor forma o conhecimento que detém e não só tomam melhores decisões, mas compreendem com mais consciência a realidade em que vivem. As pessoas não devem almejar conhecer tudo, mas buscar este entendimento pleno da realidade, a sabedoria.

Assim, tudo o que sabemos, sentimos, pensamos, concluímos e percebemos não passa de um ponto de vista, originado única e exclusivamente pela nossa capacidade de interpretar e contextualizar cada informação ao contexto de nossas vivências e conhecimentos pré-adquiridos. Esta mesma realidade que percebemos de uma determinada forma, pode e certamente será percebida de forma muito diferente por outras pessoas que viveram experiências diferentes de nós e adquiriram conhecimentos distintos.

É com a busca constante da sabedoria que compreenderemos as diferentes realidades possíveis e que nos ajudará a ponderar nossas ações e decisões em direção a um caminho pautado pelo equilíbrio e bom senso. Ao refinar nossa percepção da realidade sob estes novos paradigmas aprenderemos a conviver melhor com as pessoas, ter um melhor entendimento do sentido da vida e ter uma vida mais feliz e plena.